Há muito que desejava homenagear aquelas personalidades do mundo do Desporto, pelas quais tenho enorme admiração. Resolvi começar pelo Atletismo, e pela Corrida a Pé, que ainda é o desporto que pratico. E um nome, de entre os já infelizmente desaparecidos, me ocorreu logo, até porque ainda tive o enorme privilégio de correr ao seu lado – Fred Lebow, o criador da mais famosa das maratonas para todos, a que se corre na cidade de Nova Iorque. Sei que a memória dos homens é, às vezes, infelizmente curta, e será que, de entre os milhares que participam nas provas neste país, muitos recordam ou sabem quem foi este homem? Inclusive as centenas de portugueses que já participaram na Maratona de Nova Iorque.
Fred Lebow nasceu em Arad, Transilvânia, Roménia, em 3 de Junho de 1932. O seu nome de baptismo era Fischl Lebowitz. A perseguição aos judeus pelos nazis e seus apoiantes, em especial durante a 2ª Grande Guerra Mundial, e o Holocausto, levaram a família a fugir da sua terra natal e a emigrar, primeiro para outros países europeus, depois, parte dela para o entretanto fundado estado de Israel e outra para os EUA, entre os quais Fred, onde chegou no princípio dos anos 60 (conforme notícia do NY Times, ou talvez mais cedo, segundo outras fontes). Quando faleceu em 9 de Outubro de 1994, vítima de cancro, que o perseguia desde 1990, dos sete irmãos da família Lebowitz, três homens, dois vivendo nos EUA e um em Israel, e duas mulheres, uma vivendo nos EUA e outra em Israel, sobreviveram-lhe.
Enquanto se dedicava ao comércio de roupa, que foi a sua principal actividade profissional no seu novo país, Fred Lebow começou por jogar ténis, mas, a conselho médico, começou a correr duas vezes por semana. Gostou, acabando por participar na primeira prova, de 5 milhas, no início dos anos 70. Por essa altura entrou para o “Road Runners de Nova Iorque” e organizou, com reduzidos meios, uma primeira maratona, às voltas no Central Park, com 127 participantes, dos quais 55 completaram e ele próprio foi 44º.
A partir daqui nunca mais parou, transformando a “brincadeira” do Central Park na mais participada maratona do mundo, que serviu de exemplo a muitas outras, em muitas outras cidades, de Londres a Pequim, demonstrando um extraordinário espírito de organização, a que ligou um enorme desportivismo, no melhor sentido. “Pela força da sua personalidade este dínamo humano transformou uma obscura competição local num dos mais importantes acontecimentos mundiais do atletismo.” (até hoje!) (Grete Waitz, no belíssimo e comovente artigo desta grande atleta norueguesa, “Inesquecível Fred Lebow”, publicado em Novembro de 1995)
“Não importa que sejas campeã nas curtas distâncias. Quero que mais mulheres participem, e tu és um chamariz. Quero que esta seja uma corrida para toda a gente.” (dito a Grete Waitz, a super campeã norueguesa, antes da primeira participação desta em na Maratona de Nova Iorque, em 1978, que venceu, feito que repetiu mais oito vezes. Por estas alturas, em Portugal, ainda havia quem, com responsabilidades, considerasse que a maratona não era desporto…)
“Na corrida não interessa se chegamos em primeiro ou em último. O importante é poder dizer: cheguei!”
“A beleza da minha prova está em que os amadores correm ao lado de atletas de primeiro plano. Não vemos isso em mais lado nenhum. Não posso competir com um profissional numa partida de ténis, mas posso correr a Maratona de Nova Iorque com campeãs mundiais como Grete Waitz.”
Já em luta contra a terrível doença que o minava, esteve em Lisboa, a participar, mais ou menos incógnito (a seu pedido), na 2ª Meia-Maratona de Lisboa, em 15 de Março de 1992, a convite do seu Director, o Professor Mário Machado, tendo concluído a prova, entre 3850 participantes, em 3620º, em 2h04’36”. Foi aí que me cruzei com ele, o que para mim é inesquecível, tendo eu concluído em 3298º, em 1h52’49” (tempo oficial). E o autor do blogue, Jorge Branco, colaborou nesse ano, como de outras vezes, na organização da Meia Maratona. (ler editorial de Mário Machado, no nr.97 da Revista Spiridon, de Novembro/Dezembro de 1994 – “O Homem que Inventou a Maratona de Nova Iorque…”)
Já muito doente, haveria de fazer a sua maratona, em Outubro de 1992, em companhia da sua grande amiga Grete Waitz, com um final emocionante, em que os dois atletas percorreram duas milhas, de mãos dadas, não conseguido, nem um nem outro reter as lágrimas, aplaudidos por milhares de pessoas que não quiseram deixar de apoiar Fred Lebow naquele momento tão difícil, ao terminar a sua maratona em cerca de 5h30’.
Dois anos depois, a 9 de Outubro, apenas com 62 anos, falecia este homem inesquecível, cujo funeral se deteve diante do local de partida da Maratona de Nova Iorque, no Central Park, onde amigos lhe tinham erguido uma pequena estátua.
EVB, 4 de Setembro de 2009
Grande e tocante história!
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