domingo, 11 de abril de 2010

ENTREVISTA COM A ASSOCIAÇÃO NACIONAL DE ATLETISMO EM CADEIRAS DE RODAS


Entrevista com Mário Trindade, Presidente da Direcção da Associação Nacional de Atletismo em Cadeira de Rodas (ANACR). . .

1ª Pode-me contar um pouco da história da vossa Associação? Como e quando nasceu, projectos, principais dificuldades ao seu desenvolvimento, com que apoios contam. . R: Bem, a história da nossa associação ainda não é muito longa, pois esta associação nasceu em 30 de Outubro de 2008, ainda não tem 2 anos, mas já tem algum trabalho, em menos de 2 anos já colocámos 2 cadeiras ao dispor dos nosso atletas, uma nova entregue há pouco mais de uma semana, e uma semi-nova entregue em 2009, e no próximo mês de Abril disponibilizaremos outra a um atleta dos Açores. Os nossos projectos a curto médio prazo são: aumentar o número de praticantes, principalmente a intervenção junto dos mais jovens; Sensibilizar as organizações de provas de atletismo para a inclusão desta variante no seu calendário desportivo. As principais dificuldades são mesmo os custos dos materiais, é impossível uma pessoa portadora de deficiência iniciar-se nesta modalidade se não tiver apoio, pois uma cadeira, ronda os 5 mil euros, umas luvas 140 euros e isto são números impensáveis para quem quer fazer desporto. Até agora só tivemos uma verba do IDP – Delegação Norte e contamos também com as cotas dos nossos associados e com os eventos que vamos realizando. . 2º Como se chega a atleta em cadeira rodas, ou seja alguém que se queira iniciar na modalidade que entidades o podem ajudar, onde se deve dirigir. . R: Pois com muita força de vontade e espírito de sacrifício, não será fácil e contar com apoios muito menos. Essa foi uma das razões pela qual nasceu a ANACR, pois nunca poderá haver um Campeão sem apoio no início, normalmente os apoios vêm quando já temos resultados… Mas, se para mostrar resultados necessitamos deste investimento e não o temos, como se vão mostrar? As pessoas que se queiram iniciar nesta modalidade devem entrar em contacto connosco e tudo faremos para ajudar, é claro que não vamos dar logo uma cadeira topo de gama, terá de começar com uma cadeira usada, ver se é mesmo isso que quer e depois mediante o empenho, dedicação e resultados, poderemos pensar na nova cadeira para poder estar mais competitivo e com os elementos necessários à competição.
. 3º Julgamos que um dos principais entraves à prática da modalidade se prende com o equipamento, nomeadamente com a cadeira e o seu preço. Pensamos que uma cadeira para se iniciar na modalidade não terá nem o mesmo preço nem as mesmas características que uma de competição. Pode-nos falar um pouco sobre os equipamentos e os seus preços.
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R: Como já referi anteriormente a cadeira ronda os 5 mil euros, bem mais que uma cadeira de dia-a-dia, a nível de características também aqui é completamente diferente, antes de descrever a cadeira é bom referir que a cadeira tem que ser feita à medida da pessoa que vai andar nela, o atleta ao estar sentado na cadeira tem que se sentir o mais confortável possível, pois a cadeira é como se fossem as nossas pernas e se não estiver bem, logo não podemos tirar um bom rendimento dela, outro factor também muito importante é a aerodinâmica o atleta deve estar numa posição que ofereça pouca resistência ao ar, para a velocidade poder ser maior e com menos esforço. Quanto melhor for a cadeira e melhor o atleta se sentir nela, melhores tempos vai conseguir fazer. Estas cadeiras são feitas de alumínio, pesam cerca de 7kg; As rodas de trás são de tamanho 28” e tem uma inclinação de 11º, esta inclinação é para dar segurança, pois em descidas chega-se a atingir 70 a 80 km/h, poderão ser de raios ou de carbono, sendo que de carbono tem um custo de 1600 euros; A roda da frente é tamanho 20”, e tem um amortecedor para manter a cadeira em linha recta quando se anda depressa, também esta pode ser de raios ou carbono; Para curvar tem o volante de estrada, tem também um volante de pista que após uma afinação faz a cadeira curvar apenas com um ligeiro toque. . 4º Como em qualquer modalidade nem todos os atletas poderão ser campeões. É viável, em Portugal, ser atleta em cadeira de rodas não tendo grandes objectivos competitivos nem os patrocínios que julgamos, apesar de tudo, serem mais acessíveis aos campeões? . R: É viável, em Portugal até temos mais atletas que correm por lazer, do que por competição, fazer competição fica muito caro em Portugal, e os prémios para os primeiros lugares muitas vezes não cobrem as despesas de deslocação, o que leva a que grande parte dos atletas que estão integrados em associações corram por lazer e treinem com pouca carga, sem grandes objectivos, somente treinam para chegar ao fim da prova, porque para se ser um “campeão” é necessário muito treino muita dedicação e normalmente tem que se suportar as despesas que isso acarreta, logo a maior parte corre sem grandes objectivos. . 5º Pode-nos falar um pouco sobre as competições? Para além de algumas provas de estrada em que há escalões para a modalidade, também há provas de pista? . R: Sim, o atletismo em cadeira de rodas tem as mesmas provas que o atletismo a pé, embora em Portugal os atletas façam um pouco de cada, isto porque são poucos os atletas, são poucas as provas que temos para uma especificação, um exemplo, imaginem um atleta que se queira especializar em velocidade, ou tem muitos dinheiro para poder ir competir ao estrangeiro ou então se ficar limitado só às provas de Portugal, vai ter duas ou três competições por ano e na maior parte delas irá correr sozinho, ou então tem que pedir a dois ou três atletas que vão fazer aquela prova para fazer número. Os atletas preferem as provas de estrada porque apesar de darem pouco ainda dão algum dinheiro enquanto que as provas de pista não, logo os atletas treinam mais para provas de estrada e quando se aproxima a época de pista mudam um pouco o treino para se preparar para estas. . 6 Gostaríamos que nos explicasse como são os escalões dos atletas em cadeira de rodas. . R: No atletismo em cadeira de rodas há 4 classes que são: . Classe T51 – Tetraparaplegias; Classe T52 - Tetraparaplegias com tricepes activos e movimentos de pulso; Classe T53 - Paraplegia com músculos peitorais activos; Classe T54 - Todas as outras vertentes de deficiência em que o numero de músculos activos sejam superiores aos músculos peitorais. . Para dar uma pequena ilustração, um atleta classe T51 percorre os 100 metros em 21 segundos. Enquanto um atleta classe T54 percorre a mesma distância em 13 segundos. . 7º Como se treina para a modalidade? Em pistas? Usando determinados recintos desportivos fechados? Fazendo trabalho de ginásio? . R: Depende da época e das condições que os atletas têm nas suas zonas de residência, há atletas que só treinam em pista porque não o podem fazer na via pública nem tem um local onde o possam fazer, há outros que treinam pelas ruas da sua terra, aqui correm diversos riscos pois treinam na berma da estrada e as estradas são para os carros… mas se não for assim não podem treinar. Fazem também trabalho de ginásio quando o treinador assim o determina. . 8º Como está a modalidade em Portugal a nível de competição? Temos atletas de nível internacional a obter bons resultados no estrangeiro? . R: Apesar de não termos o apoio que os atletas dos outros países têm, ainda assim quando há competições internacionais, os nossos atletas portam-se muito bem. Temos atletas a representar Portugal em campeonatos do mundo e nos jogos paraolimpicos, poderíamos ter muitos mais e com mais qualidade, mas para isso é preciso fazer todo um trabalho de acompanhamento ao atleta que não se está a fazer, posso dar um exemplo, a elite mundial muda todos os anos de cadeira de competição enquanto que os nossos atletas andam com a mesma 4, 5 anos quando não mais. Já para não falar nas outras coisas que deveríamos ter para os atletas de topo, como por exemplo pegar nos melhores atletas portugueses, juntá-los num centro de treino para o atleta só se preocupar com isso, esta é para mim a parte mais significativa e que faz depois a diferença na competição contra os outros atletas mundiais. . 9º Quais são as marcas de bom nível internacional nos 10 quilómetros, meia maratona e maratona. . R: A melhor marca na meia maratona portuguesa é de 47 minutos do atleta Alberto Baptista Classe T54, e a melhor mundial é de 41 minutos do atleta Heinz Frei da Suíça. . 10º Gostaria de deixar alguma mensagem a todos o que sintam vontade de se iniciar na modalidade? . R: Sim, o que já tenho dito várias vezes, a vida tem muita coisa boa pra dar, apesar de todas as dificuldades, por isso se sentem vontade de experimentar esta modalidade que entrem em contacto connosco, pois tudo faremos para ajudar. A falta de convívio gera um sentimento de solidão, por isso é importante alertar para o bem que a prática desta modalidade poderá trazer a todos os níveis. Precisamos falar uns com os outros. Precisamos comunicar uns com os outros. Precisamos nos dar conta de que o desporto, seja ele adaptado ou não é gerado por pensamentos que se traduzem em palavras e por fim se convertem em actos concretos. E tudo isto pode acontecer a curto ou a longo prazo, trazendo consigo boas consequências.. É uma questão de "bem" ou de "mal", uma questão de usar uma virtude ou um defeito humano.




Fotos UK e ANACR

6 comentários:

  1. Admiro muito esses atletas...eles poderiam simplesmente ficar em casa se queixando da vida...e das suas privações...mas são exemplos...
    Parabéns pela repostagem...
    Bjinhos
    Boa semana
    JU

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  2. Um grande abraço a estes companheiros. Ainda ontem estivémos juntos, a participar na Meia Maratona de S.Miguel, uma das que "se lembra" de contemplar todos os atletas. Se para ser campeão é necessário ter força de vontade, estes amigos são "GRANDES CAMPEÕES"!

    Grande abraço,


    A.Belo

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  3. eu estive presente na meia maratona de s miguel
    um abraço a todos os atletas se alguem tiver as classificaçoes que as publique obrigados

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  4. Boa noite Amigos,

    Antes demais obrigado pelas vossas palavras.
    como diz a "Ju" poderíamos simplesmente ficar em casa poderíamos mas não era a mesma coisa hehe onde é q já ouvi isto…
    quanto a meia dos açores, vale pelo convívio e pela beleza das paisagens, como prova é das mais duras que já participei.
    Quanto as classificações que pede o sr “lima” não sei se se refere a dos atletas em cadeira de rodas ou as gerais, aqui ficam as nossas as outras não tenho.
    Nome Clube Tempo
    ALEXANDRE SILVA ANACR 1,01,12
    EDUARDO BACALHAU ANACR 1,12,01
    NELSON SAMPAIO APD Paredes 1,41,32
    MÁRIO TRINDADE ANACR 1,42,50
    HÉLDER FERNANDES ANACR 1,57,00
    HÉLDER MESTRE ANACR 2,08,55

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  5. Já tive as classificações gerais. Podem pedir para: Ruben Melo nssm@sapo.pt


    Belo

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  6. Esta é uma modalidade esquecida e que fiquei a conhecer muito melhor depois de ler esta excelente reportagem que me sensibilizou para os problemas que os atletas têm que enfrentar para poderem fazer desporto.

    Numa altura que muito se discute o "social", ele não deveria ser obrigação e preocupação de todos?!?

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