quinta-feira, 15 de outubro de 2009

AS CORRIDAS MAIS DIFÍCEIS – IIIª MARATONA SPIRIDON

Foi na Granja do Marquês, junto à Base Aérea nº1, em Sintra, que se realizou há quase 25 anos, em 8 de Dezembro de 1985, a terceira maratona organizada pela Revista Spiridon.

E com algumas particularidades, que os maratonistas de hoje já não estão habituados: um percurso em circuito com 6 voltas, de 7 km cada, praticamente plano, em que os únicos assistentes eram os apoiantes dos atletas, incluindo aqueles que foram encarregados de entregarem os abastecimentos individualizados, e que cumpriram até ao fim, e em péssimas condições de tempo, a sua tarefa.

Parece fácil, mas acreditem que não é! A não ser, para alguns, devido ao aspecto psicológico da contagem em decrescente das voltas que faltavam. Mas a solidão do corredor de fundo assume aqui um enorme papel, numa prova sem público ao longo do percurso, ao contrário do que acontece na maior parte das grandes maratonas internacionais.

No entanto a escolha do local teve a ver com a preocupação, aliás de sempre, do director da prova, Prof. Mário Machado, de conseguir que os atletas, do primeiro ao último, fizessem a corrida sem serem incomodados pelo trânsito automóvel, o que, passado um quarto de século, continua a não ser, infelizmente, garantido para os últimos do pelotão na maioria das maratonas deste país! Desculpem o desabafo, mas isto está tudo ligado, e tal facto tem muito a ver com a mentalidade dominante dos que em geral chegam ao poder (porque não colocamos lá outros), neste país.

Mas o que tornou esta prova particularmente difícil, para os mais lentos em especial, foi um tempo invernoso, com chuva e vento, embora com algumas abertas, ao longo das aproximadamente quatro horas, que os últimos atletas levaram. De vez em quando lá vinha uma descarga de água mais ou menos fria, que descontrolava os maratonistas.

Para mim, foi no entanto, o início da última volta que me foi fatal. Os primeiros já tinham obviamente terminado. Faltavam-me cerca de 7 km para terminar e sentia-me muito bem, capaz de atingir, e se calhar melhorar, o tempo que o orientador do Centro de Treino (João Pires) me havia indicado como objectivo, baixar das 3 horas e 20 minutos. Eis senão quando, quase já ultrapassado o famoso muro da maratona, que se situa entre os 30 e os 35 km, cai uma saraivada enorme, acompanhada de grosso granizo, que, atingindo-nos no corpo, e em especial na cabeça, nos magoava a sério. Confesso que talvez tenha sido o momento mais delicado deste género, em trinta e tal anos de corridas. O efeito foi trágico porque me levou a acelerar, ainda muito longe do objectivo e o resultado não podia ser pior: a articulação de um joelho, salvo erro do direito, foi atingida. A partir daí foram 7 quilómetros a penar, com dores, arrastando a perna, mas não querendo desistir em caso algum, para concluir em 3H30’30” (174º).

Apesar do mau tempo, dos 307 inscritos, 298 compareceram à partida e 191 conseguiram mesmo concluir a prova. O favorito era um conhecido atleta sul-africano, Samuel Ndala, que afinal foi segundo, tendo a vitória pertencido a um maratonista verdadeiramente amador, bancário de profissão, Américo Ferreira, que fez 2H23’39”.

Mas “numa prova de 42 km só existem vencedores” (prof. Mário Machado, na Revista Spiridon nº44, no artigo sobre a prova), e relembro muitos dos companheiros e amigos da estrada que participaram em mais esta aventura, a maioria dos quais ainda muito activa – Esmeraldo Pereira, António Belo (um dos atletas portugueses com mais maratonas concluídas), João Palma, António Casqueiro, Daniel, José Martelo, Luís Sequeira, Jorge Branco, Manuel Martins (ilustre médico, organizador dos Jogos Médicos, e que aqui fazia, já, a sua 12ª maratona), António Realinho, João Marcelino, Arnaldo Chora, Ana Massas, José Martins, Arons de Carvalho, Fernando Cardia, António Malvar, Virgílio Palminha, etc, etc, exemplares pelo seu desportivismo.
EVB

Outubro de 2009

Nota: A foto que ilustra este texto foi obtida na internet
não se reportando a nenhuma prova Portuguesa. JBT

6 comentários:

  1. Carissimo companheiro de estradas, fiquei muito sensibilizado pelo artigo desta III maratona Spiridon. Foi a minha estreia. Foi a 1ª de 12.Hoje, com 66 anos e apesar de algumas lesões e érnias discais, ainda posso matar o vicio em algumas corridas de 10 km. No entanto treino 3 vezes por semana ( Monsanto-Lisboa ). Merceu a pena vir ao GOogle e deparar com o vosso artigo O qual me trouxe gratas recordações da corrida, do convívio,da amizade e pela beleza natural deste tipo de desporto. Bem Haja. Um abraço fraterno

    ResponderEliminar
  2. Prezado amigo Arnaldo Chora.
    Em nome dos coordenadores deste desde blogue um enorme e fraternal abraço.
    Podes escrever-nos para teixeirajb@gmail.com

    ResponderEliminar
  3. Este relato da 3ª edição da Maratona Spiridon de 1985 fez-me relembrar parece-me que a 4ª edição, em que participei e que em termos climatéricos me parece que foi muito idêntica!! Acho que participei nessa edição, que se realizou em Cascais, com 2 voltas ao circuito habitual dos '20 Km de Cascais', em que fiz a estreia na maratona e calhou-me (...) um dia de tempestade, com grande chuvada na altura da prova e em que me recordo especialmente de passar naquela pequena e velha ponte, à entrada da vila de Cascais, vindo do Guincho, a 250mts da meta e onde passei com a água pelos tornozelos, tal não foi a carga de água que caiu naquela altura. Foi a m/estreia na Maratona e vai ficar para sempre gravada ...
    Obg pela recordação!!
    Alexandre Duarte

    ResponderEliminar
  4. Mais uma grande história, que só agora descobri (só conheço este excelente blog há uns meses e ando a descobrir as suas pérolas)

    Sobre o correr às voltas, raramente tenho alguma dificuldade em treinar 10 kms, faço-o todas as semanas e mais do que uma vez por semana. Mas um dia decidi ir para a pista do Jamor fazer os 10 kms correndo as 25 voltas.
    Que dificuldade! Ia contando as voltas e aquilo tornou-se de tal maneira monótono que estava a ver que desistia a meio!
    No entanto, as 3 voltas que se dá na corrida do Cartaxo, são muito agradáveis, tal por serem só 3 ou por haver público, daquele que aplaude e tudo, o que não é hábito por cá!

    Um abraço

    ResponderEliminar
  5. Amigos e companheiros de estrada(s)

    Só agora descobri este blog e as suas histórias e,como não podia deixar de ser, as memórias jorram em catadupa tal com a chuva e o granizo na tão relembrada maratona da Granja do Marquês/Base Aérea.
    Também para mim ela foi a primeira.
    Tinha havido anteriormente uma tentativa no Autódromo ainda com muito medo da distância que terminou,como estava planeado, aos 25km.
    Fui só "para ver como era".
    Pois sim ...
    Estou agora a viver em Inglaterra pelo que já não tenho os dados sobre as 3 ou 4 maratonas que então fiz.
    Agora que voltei às Maratonas lembrei-me de tentar encontrar estes dados na net e eis que aqui nos encontramos.
    Já agora uma pequena recordação ainda sobre a Maratona da Granja do Marquês : Naquele dia,friorento como sou, comecei a corrida com um blusão e calças impermiáveis. A meio da prova resolvi despi-los e o prof. Mário Machado ofereceu-se amavelmente para os guardar até ao fim da corrida.
    Acontece que quando eu cheguei,perto do fim do pelotão como sempre, a chuva e o granizo estavam no seu auge pelo que cortei a meta e corri o mais depressa que pude para o carro a fim de me abrigar e trocar de roupa.
    Nunca mais me lembrei das calças e do blusão.
    Mais tarde contactei o prof. M.Machado através da Spiridon e combinámos a entrega das coisas.
    Por uma razão ou outra, a troca só teve lugar uns meses mais tarde e tudo se tornou em mais um pormenor da "Minha Primeira Maratona"
    Um grande abrade

    António Vicente

    ResponderEliminar
    Respostas
    1. Mais uma grande recordação amigo António Vicente. Seja muito bem vindo a este espaço que é também seu!
      Um abraço.

      Eliminar