domingo, 1 de julho de 2012

A MAIS IMPORTANTE DAS COISAS SECUNDÁRIAS


“A corrida é a mais importante das coisas secundárias” é uma frase, muito ligada ao Movimento Spiridon, que temos escutado ao longo dos anos.
Realmente a corrida é isso mesmo, mas ela entrelaça-se de tal maneira com a vida que as coisas principais não teriam a mesma força, o mesmo cheiro, a mesma cor e  o mesmo sabor sem a corrida.
Quando se passa a fase inicial da descoberta da corrida, quando se ultrapassa a luta pelas melhores prestações possíveis,  quando já passaram milhares de quilómetros pelos nossos pés, correr torna-se algo tão natural como comer.
Faz parte da nossa vida, da nossa existência,  que sem ela as coisas principais da vida não teriam razão de ser.
Talvez muitos fiquem pelo caminho e não cheguem a esta fase, em que a palavra treinar faz muito menos sentido que a palavra correr. Já não se treina na busca de melhores performances, corre-se por gosto, por uma questão de equilíbrio físico e emocional, pela busca da liberdade e do nosso eu mais profundo.
Quando já se corre há 20, 30 ou mais anos isso é tão natural e necessário como o simples acto de comer.
Podemos ter mais ou menos problemas, estar mais ou menos infelizes, ter mais ou menos tempo, mas não podemos passar muito tempo sem comer e isso aplica-se da mesma forma à corrida.
Podemos correr ou comer menos, saltar refeições ou treinos mas invariavelmente temos de nós alimentar e correr! Já faz parte da nossa natureza.
Quando já se leva um vida de ligação com a corrida, ganhamos o hábito de fundir o nosso desporto preferido com as tais coisas principais da vida, tornando tudo numa argamassa única.
Destes longos anos que levamos de corredores de fundo podemos consultar tudo o que foi a nossa vida nas pequenas notas que escrevemos junto dos registos de cada treino ou de cada corrida.
Problemas, alegrias, tragédias, vitórias e derrotas estão todas nessas pequenas notas, primeiramente ainda escritas à mão e agora registadas em computador.
A fusão entre as coisas principais da vida e a mais importante das coisas secundárias, ou seja a corrida, faz com que os nosso diários de  treino sejam também um diário de vida.
Mais que saber a forma em estávamos no ano x dia y os nosso diários de treino permitem lembrar-nos com precisão momentos impares da nossa vida: aquele treino cheio de felicidade antes do nosso casamento, um treino marejado de lagrimas  imediatamente a seguir a sabermos da doença, gravíssima de um ente querido, aquele treino perpassado de dor e saudade depois de o falecimento de alguém de quem gostávamos, em que a alma pesava que nem chumbo e as pernas queriam teimosamente não andar.
Quem leva longos anos de uma paixão intensa com a corrida mistura esse prazer único e libertário que é o acto de correr, com dores, alegrias e tristezas da vida, e cozinha tudo no formo que é a existência diária de cada ser humano.
Não se pode separar a vida do acto de respirar, comer, beber e amar. Não se pode separar a vida do acto de correr. Pelo menos para nós amantes de longa data das estradas (e dos trilhos), percorridas em pequenas passadas, tal é impossível.
AME A VIDA E AME A CORRIDA!
A VIDA É A CORRIDA E A CORRIDA É A VIDA!
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Texto dedicado a um grande amigo meu, brevemente futuro maratonista.
A um amigo e companheiro de sempre que está a regressar à estrada.
E à minha mãe, a melhor mãe que um corredor de fundo pode ter!
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Jorge Branco

        

4 comentários:

  1. Um texto que nos deixa sem palavras e não só!

    Um muito sentido abraço, amigo Jorge

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  2. Excelente texto! É por isso que gosto de passar sempre pelo seu blog, o amigo além do amor pela corrida, tem o dom da palavra!

    Um abraço e boas corridas

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  3. Brilhante reflexão Jorge Branco!

    Concordo com tudo o que aí escreveu e só quem corre é capaz de perceber essas palavras...

    Um bem haja e boas corridas!
    Abraço

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  4. Bom texto, para mostrar o que é a corrida, eu corro à menos tempo, mas o suficiente para perceber e concordar plenamente com tudo o foi escrito aqui.
    beijinho no coração, obrigada pelas suas sempre agradáveis e assíduas visitas.

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