sábado, 24 de novembro de 2012

OUTROS TEMPOS, OUTRAS MANEIRAS DE ESTAR NA CORRIDA.

Ao ver a maneira como os corredores interagem uns como os outros, a maneira como anda esta corrida, nestes tempos globalizados, nestes tempos da Net, não posso deixar de fazer comparações com a década de 80, quando comecei a minha ligação com a corrida a pé.
Na década de 80 o corredor era um ser muito mais isolado e solitário dentro do mundo da corrida e a informação era muito mais escassa e difícil de obter.
As poucas ligações que havia entre corredores limitavam-se a quem corria através de pequenos clubes ou amizades que se estabeleciam nos locais de treino mais frequentados como (e dando os casos de Lisboa, que era o que eu conhecia) o Estádio Universitário, o Estádio 1º de Maio, do Inatel, e o Estádio Nacional.
As informações mais técnicas sobre corrida, os métodos de treino, as últimas novidades, eram dadas basicamente pela Revista Spiridon que se lia, avidamente, de dois em dois meses. Lá havia uma ou outra troca de conhecimentos com outros corredores, mas como os contactos entres os amantes da corrida eram muito mais escassos a informação circulava muito mais devagar.
Hoje tudo isto mudou radicalmente e com os blogues, Facebook, fóruns e outros suportes que a Net tem. A informação e troca de opiniões entre corredores passou a ser quase instantânea fazendo-se muitas amizades virtuais (e algumas depois tornam-se em grande amizades reais).
Qualquer corredor com um blogue acaba por se tornar assim como quase uma figura pública da corrida e todos sabem a sua forma actual, capacidades atléticas, sonhos e projectos.
Por esta via da Net acaba por haver uma grande solidariedade e troca de experiências e acabamos por dar connosco a abrir, ansiosamente, o blogue daquele amigo (que até podemos não conhecer pessoalmente) para sabermos como lhe correu determinada prova ou o projecto em que estava muito empenhado.
Damos connosco a sentirmos alegria com os sucessos dos outros e tristeza quando as coisas correm menos bem. Acaba por haver toda uma comunidade de corredores que se entreajudam mutuamente.
Estamos convencidos que esta comunidade virtual é muito benéfica para a corrida, que se trocam muito mais facilmente expêriencias e ensinamentos, que os corredores se sentem muito mais apoiados e que em particular é muito mais fácil aos novatos do nosso desporto favorito darem os seus primeiros passos.
Claro que nem tudo é um mar de rosas neste mundo de corredores virtuais: a informação transmitida é muita mas nem sempre tudo o que se transmite tem qualidade e rigor científico e circula muita informação errada. Têm sempre que se comparar as informações transmitidas com a experiência de quem as transmite, de modo a filtrar a informação e saber aproveitar o que é verdadeiramente válido.
Depois não podemos pensar na Net como uma verdadeira panaceia para todos os males, onde se descobre e sabe tudo.
Ainda não há muito tempo chegou-me um mail, meio desesperado, de um atleta veterano que andava com problemas como os seus treinos e não obtinha respostas dos seus colegas de treino que pouco o escutavam e apenas lhe diziam para ir á Net.
Não conhecendo esse amigo pessoalmente (que viu em mim alguém que o poderia eventualmente ajudar devido a coisas que leu escritas por mim) tentei transmitir-lhe alguns conceitos básicos sobre a corrida e o treino dizendo-lhe logo que não era treinador de atletismo, nem nada que se parecesse, e até disponibilizando-me para lhe tentar arranjar uma ajuda de alguém que fosse profissional na matéria.
O certo é que esse amigo descobriu através dos conceitos básicos que lhe transmiti os erros que estava a fazer nos treinos e com a sua correcção os seus problemas começaram a desaparecer!
Esse amigo que me “tocou à porta” teria visto o seu problema resolvido bem mais rapidamente se os amigos dele “perdessem” algum tempo a escutar o seu problema e a ajudar a ver onde estavam os erros no seu treino, em vez de o “despacharem” para a Net, como sendo a solução milagrosa para tudo!
Sim, não podemos pôr de parte o contacto humano e o saber escutar o outro, em troca de um mundo virtual!
Outra coisa que se perde um pouco com os blogues e com o Facebook é uma certa privacidade pessoal, mas na verdade quem quiser continuar a ser um corredor anónimo só tem de não se expor nesses meios.
Pessoalmente confesso que ainda me estou a habituar a essa exposição mediática, que é algo estranha para quem vem dos tempos “obscuros” da década de 80!
Confesso que embora goste dessa exposição e me sinta bem com o carinho com que sou tratado e com os incentivos que recebo, às vezes ainda sinto algumas saudades do tempo em que se ia uma prova e só se era conhecido por um muito escasso grupo de amigos, que por uma ou outra razão se cruzavam com os nossos treinos.
Depois, o acto de expor objectivos publicamente, divulgar todo o trabalho que se tem desenvolvido para os alcançar e depois expor o resultado final ou seja como correu a prova, depende muito da natureza de cada um.
Lembro-me que quando fiz a minha primeira maratona, não disse a ninguém que andava a treinar para esse objectivo.
A nível familiar só o sabia o meu tio Egas, que estava a treinar para o mesmo objectivo, e os amigos, só aqueles que comigo treinavam no Centro de Treino para a Maratona, organizado pela revista Spiridon, estavam a par do meu projecto de correr os 42,195 km.
Sentia-me a treinar para o meu projecto “secreto”, sem perguntas nem pressões.
Lembro-me de chegar a casa depois de concluir a maratona e o meu avô me perguntar: quantos km tinha tido a prova de hoje e lhe ter respondido com a aparente maior das naturalidades (e disfarçando um enorme orgulho): 42,195 km, ao que o meu saudoso avô respondeu: mas isso é a Maratona, és doido!
Se me voltar a nalgum grande projecto a nível da corrida (e essa possibilidade está cada vez mais longe) ele vai ser, novamente, secreto e só anunciado depois de concluído. Enfim, manias!

20 comentários:

  1. Velhos, mas saudosos tempos, Jorge... Embora as novas tecnologias dêem um "jeitaço"...

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    1. Dão mesmo um "jeitaço" as novas tecnologias!
      Um abraço!

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    2. Amigo Jorge, isto fica só ente nós, que ninguém vê: dia 9 vou correr a minha primeira maratona! Um abraço.

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    3. Uma excelente estreia são os meus votos amigo João: Que seja a primeira de muitas!

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  2. Nos anos 80 era pequenina. Os meus primeiros contactos com a corrida vieram do meu pai, que corria (recordo-me de ver as revistas Spiridon lá por casa quando ainda mal sabia ler), e de ter andado durante uns tempos no Grupo Desportivo do meu bairro. Corria porque via o meu pai fazê-lo e porque todos os meus amigos lá andavam também. Portanto não posso comparar, porque não só eram tempos diferentes como a idade era diferente também.
    Hoje tudo é mais exposto, não só no mundo das corridas como em tudo. Esse fácil acesso tem coisas boas e coisas más...
    Quanto à sua "mania", acho que faz muito bem! Como dizem, o segredo é a alma do negócio! :) O importante é o gosto pessoal nesses projectos, os restantes, a ter de saber, saberão a tempo certo.

    Boas corridas! Bjs

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    1. Se filha de peixe sabe nadar, filha de corredor sabe correr!...
      Se calhar até conheço o teu pai!
      Bjs

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  3. Excelente artigo (como habitualmente), que toca numa série de pontos.
    Um é a ponte entre o mundo "obscuro" e o demasiado aberto. Cabe a cada um ver onde se sente melhor e fazer o ponto de equilíbrio entre o escasso e o supérfluo.

    Um grande abraço e fico à espera que caia que nem uma bomba o resultado dum projecto secreto. Como sabes, eu acredito que um dia ainda vais surpreender todos e, em especial, a ti próprio!

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  4. Obrigado João!
    Quando a "bombas" quem sabe...Quem sabe!
    Pode ser que surja um janela de oportunidade neste esqueleto empenado e eu a consiga aproveitar como fazem os alpinistas em relação as condições atmosféricas para conseguirem alcançar o topo do Evereste (embora o meu "Evereste" já foi alcançado há muito tempo!).
    Abraço.

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  5. Grande Jorge Branco.
    Uma reflexão de grande valia, em que me revejo completamente. E como estão mudadas as coisas desde os tempos em que a Corrida se soltava das amarras...! Nesta meia dúzia de anos em que utilizo a net já conheci cem vezes mais pessoas que nos outros trinta. Sem a menor dúvida, a Corrida ganha muito com a actual facilildade de comunicação entre os corredores.
    Um tema muito bem lembrado, Jorge.Parabéns e obrigado pela partilha.
    Abraço.

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    1. "Grande" Fernando Andrade!
      Uma honra e uma grande alegria ter de novo o "Pai" da blogosfera corredora de volta as lides "bloguistas"!
      Forte abraço e vivam as rampas!

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  6. Muito bem !De facto o senhor é um "expert" nestas coisas da corrida a pé .
    Estou de acordo com tudo o que aqui foi escrito por si , mas de facto hoje em dia as novas tecnologias dão um certo jeito.Eu próprio que sou novato nisto já sinto essa "popularidade" nas provas em que participo devido ao meu blog e também á minha forma de estar (sou muito sociável).Quanto ao seu projecto , amigo Jorge ....nunca é tarde e quem sabe um dia destes temos uma surpresa.Um abraço de admiração e respeito por tudo o que tem feito (e continua)pelo atletismo popular.

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    1. Obrigado pelas suas palavras amigo mas pode retirar o "expert" e o senhor!
      Sou um simples amante da corrida e nada mais que isso!
      Um abraço.

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  7. A 10ª Maratona do Porto lá para Novembro 2013 daria um excelente projecto secreto meu Amigo Jorge!!!

    Concordo no geral do que transmite aqui, e a meu ver apenas acrescento o seguinte sobre o Virtual e o Real: as pessoas são precisamente as mesmas, aqui, ali, na estrada ou atrás de um ecrã. A Net com as suas coisas boas que as tem, não é mais que uma amostragem do Real, também com as suas coisas boas e com as más também naturalmente. Cabe-nos a nós, (sempre!) seleccionar, dar o devido e proveitoso uso, e aí sim, estaremos no caminho da progressão. Como atletas e como pessoas.

    Um beijinho Jorge e o projecto secreto quando vira público, se por um lado nos poderá pressionar, também nos pode servir de motivação!!! Lá está...há os 2 lados, cada um utilizará o que for mais de acordo consigo próprio e com o fim que pretende.

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    1. Sempre sabias as palavras daquela que para mim é a mãe da Blogosfera Corredora e uma referencia, incontornável, para quem gosta de correr e escrever.
      A Ana é talvez a maior "culpada" de me ter metido nesta "coisa" de ter um blogue pois foi através do seu que tomei o meu primeiro contacto com os blogues dos quais eu não percebia nada!
      Beijinho.

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  8. Como percebo o que dizes.
    Eu debati-me um bocadinho até decidir criar um blogue, porque gosto muito da minha privacidade. Por alguma razão não tenho Facebook...mas poder partilhar aquilo que sinto quando corro, receber conselhos e o simples acto de escrever também pode ser terapêutico.
    Outra razão foi sentir que os meus amigos não compreendiam bem esta paixão. Pensavam que eu estava louca :)
    Com o blog sei que só quem quer e quem se interessa por corrida é que me irá ler e compreender esta paixão.
    Se tiveres algum projecto em mente só desejo que tudo corra bem e como tu desejas que corra.
    Beijinhos e boa semana.

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  9. Bem Isa o Facebook tudo depende da maneira que lá se está, do que se publica, dos amigos que temos, das permissões que concedemos etc, etc,
    Pode-se estar no Facebook de uma maneira muito mais reservada e discreta ou muito mais aberta depende de cada um!
    A nível da corrida por vezes encontram-se coisas que não aparecem nos blogue e são muito interessantes.
    Não tenho projectos secretos só alguns sonho mas não sei se o esqueleto ainda dá para os fazer!
    Beijinhos.

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  10. Os desejos secretos de fazer aquele tempo, participar naquela prova que está um pouco acima das nossas possibilidades, acho que devem manter-se em segredo :)
    Quanto à partilha de experiências, crónicas, essas adoçam a nossa vida!
    Excelente artigo!

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  11. Olá amigo Jorge, parabéns pelo têxto gostei imenso de o ler e aquela foto espelha bem a realidade de então no que toca a comunicação. espero que o projecto ou a surpresa penda para o meu lado, a estrada já está cansada e saturada de tanto pontapear, agora chegou a hora de dar uma oportunidade à Natureza para nos acolher por uns tempos e como não se esgota de visitantes nem a sua qualidade você tem sempre as portas abertas para grandes projectos e ambições, se puder ajudar é só bater à porta, Abraço

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    1. Obrigado grande amigo Joaquim Adelino.
      Vamos ver se este esqueleto empenado ainda dá para surpresas!
      O amigo Joaquim Adelino é uma ajuda permanente! Basta o seu exemplo para motivar uma pessoas a superar os seus limites ou problemas físicos.
      Forte abraço.

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