Com o 25 de Abril também a
revolução e a liberdade chegaram ao desporto e muito particularmente à corrida
com as provas abertas para todos.
A conquista do alcatrão, ou
melhor dizendo da estrada, por parte dos atletas populares foi a pulso, ou
melhor, passada a passada, com imenso esforço, dedicação e trabalho.
Hoje é banal, e até quase uma
moda, correr, e as provas para todos são algo perfeitamente enraizado na
sociedade portuguesa.
Mas naquela segunda metade da
década de 70 e em grande parte da década de 80 nada era assim.
A corrida era só para os
atletas de elite e a sua participação estava vedada ao atleta popular. Só os
melhores podiam correr em provas.
E este estado de coisas
acontecia não só em Portugal como a nível Europeu e contra isso surgiu o
Movimento Spiridon a nível de vários países Europeus. Mais que dizer que o
Movimento Spiridon era contra alguma coisa é mais correcto dizer que o
Movimento Spiridon era a favor da participação de todos os atletas em provas
independentemente das suas capacidades atléticas, pelo direito a todos poderem
correr uma prova, pela inclusão e não pela exclusão.
Com a chegada do 25 de Abril
também o Movimento Spiridon chegou ao nosso País embora lutando ainda contra
mais preconceitos pois vínhamos de uma longa ditadura fascista, de um país
cinzento, triste, pobre e reprimido em que o desporto de massas, como tudo o
que cheirásse a colectivo, não era nada bem visto pelo poder vigente.
Mas com os ventos da
liberdade, com a “tampa” que saiu de cima dos portugueses e com o empenho,
engenho, arte e trabalho de muita gente, a corrida para todos foi-se
implantando e ganhou uma força avassaladora.
Logo em 16 de Novembro de 1975
a primeira Meia Maratona Internacional
da Nazaré conta com um número extraordinário 146 atletas classificados num
Portugal recentemente saído de uma longa ditadura fascista, em que quase ninguém
sabia o que era uma meia maratona e mesmo um conhecido técnico de atletismo
afirmou que a maratona não era desporto e que não havia era coragem para acabar
com ela!
Para se ver o extraordinário
crescimento da corrida em Portugal basta verificarmos que na quarta edição da Meia Maratona Internacional da Nazaré,
em 12 de Novembro de 1978 o número de atletas chegados é de 1.617! Essa 4ª
edição da prova ficaria também na história por coincidir com o lançamento da Revista Spiridon, porta-voz do
Movimento Spiridon em Portugal, e que foi distribuída aos participantes na
prova.
Pese embora o forte
crescimento da corrida para todos não foram nada fáceis aqueles anos de
pioneirismo da corrida em Portugal. Curiosamente havia uma forte oposição da
parte da Federação Portuguesa de Atletismo a tudo o que fossem provas
populares!
Os atletas que corriam essas
provas eram apelidados de “coxos”, (mas foi do meio desses “coxos” que saíram
grandes nomes do atletismo mundial!), as provas eram apelidadas de “voltas ao
coreto”, “provas dos chouriços” (numa alusão jocosa aos prémios dados nas
provas populares) e ao treinar-se na estrada ouvir “mimos” como “vai trabalhar
malandro!”, “és maluco!” era algo com que se lidava diariamente.
Mas os “coxos” conquistaram a
estrada e hoje a corrida para todos é uma realidade fortemente implantada em
Portugal.
Da estrada passou-se para os
trilhos, para as provas de montanha, para o que hoje se designa por trail e que
começou em Portugal pelas mãos do Professor António Matias, Terras de Aventura, a meio da década de
90 do século passado.
Mas durante estes anos todos
houve sempre um território vedado aos atletas populares: a pista!
Conquistámos as ruas e a
estradas, mais tarde os trilhos e as montanhas, mas os míticos 400 metros de
uma pista de atletismo sempre foi algo longínquo para o atleta popular.
Também diga-se em abono da
verdade que no começo da corrida para todos o ideal era a busca pela liberdade
e talvez não fosse muito apelativo correr numa pista.
Mas nos dias de hoje faz todo
o sentido que seja possível ao atleta de pelotão poder experimentar as suas
potencialidades nos 400 metros de uma pista de tartan independentemente do seu
valor e capacidades atléticas, é talvez a última etapa da corrida para todos
por concluir: o permitir aos atletas de pelotão a participação em eventos numa
pista de atletismo.
Felizmente que já algumas
entidades permitem aos “coxos” a experiência única e diferente de correr numa
pista de atletismo.
Pioneira no desafio de levar
os corredores da estrada para a pista está a Xistarca com a sua prova de 5.000
metros em pista, já com cinco edições.
Também com 5 edições o
Challenge 3000, na distância de 3.000 metros que se realiza desde 2014 tendo
tido uma prova nesse ano e duas em 2015 e 2016.
Por último temos as Noites Quentes do Restelo, igualmente
com 3.000 metros e com 3 edições efectuadas.
Esperemos que mais iniciativas
deste género, e até com outras distâncias, venham a aparecer no calendário,
Sabemos que pelas suas
características técnicas terão que ser provas de pequena dimensão mas julgamos
saber igualmente que são provas do ponto de vista financeiro muitíssimo mais
económicas que uma corrida em estrada onde só os encargos com o policiamento
são exorbitantes.
A liberdade de correr nas
ruas, e montanhas, é algo de único e mágico mas quem ama correr, gosta de
testar os seus limites e ter uma experiência diferente, não há nada que se
possa comparar com a exactidão de uma pista de atletismo. E se fossemos
obrigados a correr sempre em pista seria uma “seca” enorme mas uma ou outra
experiência numa pista de tartan pode ser algo de muito motivador e único na
nossa experiência como corredores.
Esperamos ver mais iniciativas
que levem os “coxos” á pista!
Texto muito bem redigido e esclarecedor.
ResponderEliminarMuito bem, Jorge!
Um abraço
Obrigado João.
EliminarAs fotos da Mafalda, com a excelente qualidade a que já nos habituou, ajudaram imenso a dar um melhor aspecto gráfico ao texto. Grato pela colaboração e sem o teu históricas das provas Portuguesas nada seria igual! Um abraço.
Que grande texto Jorge.
ResponderEliminarNa estrada, em trilhos ou na pista. É bom correr em todo o lado, é bom poder variar e viver diferentes experiências.
Beijinhos e boas corridas
Olá Dona Isa ;)
ResponderEliminarÉ isso mesmo: é bom correr em todo o lado!
Beijinho e abraço para o Ultra Casal!
Muito bom e informativo texto. Obrigado Jorge. Eu nunca corri em pista, e gostava de experimentar um dia. Aqui a norte não me parece haver ainda nenhuma prova dessas, aberta aos "coxos". Um dia, quem sabe ...
ResponderEliminarAbraço
Obrigado Carlos Perneta Cardoso! :)
EliminarEspero que também cheguem ao norte as provas em pistas acessíveis a todos os corredores e possas experimentar o prazer de voar no tartan!
Aquele abraço.
Muito bom texto, Jorge.
ResponderEliminarClaro e elucidativo.
Já não corro em pista há uma vida...e depois de ler o artigo do João Lima fiquei com o bichinho ;)
Abraço
Obrigado.
EliminarÉ dar força a esse "bichinho"! :)
Um abraço.