Por: Egas Branco
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A recordação veio-me
outro dia, quando ainda ensonado, iniciei a marcha matinal pelas ruas do meu
bairro, àquela hora ainda desertas de trânsito, apenas me cruzando com alguns
vizinhos e transeuntes, apressados a caminho do trabalho ou da escola.
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É que semicerrei os
olhos e deixei-me ir, tentando um andamento confortável que me mantivesse
naquele estado de semi-modorra, enquanto a “máquina” ainda ia a aquecer os
motores.
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E lembrei-me de outros
tempos, quando se faziam treinos no duro, a pensar em conseguir melhorar
resultados competitivos. Não de vencer ou ultrapassar os companheiros de
estrada mas de melhorar resultados pessoais, em termos de tempos gastos a
percorrer distâncias – os 10 km, os 15 km, os 21,097 km, os 42,195 km, para só
falar nas distâncias que todos, modestos ou bons atletas, desejamos vencer no
menor tempo possível.
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Lembrei-me em
particular dos chamados treinos longos, de final de semana, em geral ao domingo
de manhã, em que íamos do Estádio Nacional, ou do Jamor, na Cruz-Quebrada,
subindo primeiro até Linda-a-Velha, descendo depois para Carnaxide, prosseguindo
a caminho de Queluz, virando depois na direcção do mar, para Laveiras, Caxias e
o retorno final ao Estádio. Era coisa para duas horas e meia, às vezes um pouco
mais, quando fazíamos alguma derivação que aumentasse o percurso.
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E era nesse percurso,
em certo troço, em que a estrada descia, o trânsito era praticamente
inexistente, que desligávamos a máquina, fechávamos os olhos e vogávamos, numa
harmonia entre cérebro, coração, pulmões e músculos, num estado que julgo que
só quem corre é capaz de alguma vez sentir, em que o esforço parece nulo e
temos a sensação de poder continuar a correr durante um muito longo período
tempo, a que não vislumbramos o fim.
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Claro que só recomendamos
a alguém que o experimente se conhecer muito bem o percurso, normalmente de
estrada, por causa do piso, e em que não haja o perigo de ser surpreendido por
algum veículo.
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Suponho que seja
também por isso que Nöel Tamini, um dos professores grandes entusiastas por
este desporto, por esta actividade física, afirmou um dia que “a corrida é a
mais importante das coisas secundárias”.
Foto original aqui.
De olhos fechados, acho que nunca corri. Mas com eles abertos sem ver nada, sim, naquela parte escura de Peniche.
ResponderEliminarE com eles abertos e a sonhar... tantas vezes!
Excelente texto!
Um abraço
Muito bom....lembro-me de ter fechado os olhos no ano passado na Maratona do Porto....logo nos primeiros km a descer a Boavista e um pouco mais tarde já na Foz para sentir a maresia...breves segundos para me alhear de tudo à volta e sentir verdadeiramente a corrida. Ás vezes faço-o (sempre por curtos espaços de tempo) e curiosamente é quase sempre de manhã muito cedo, sozinho e em dias de longão (por norma ao domingo de manhã)....coincidências de corredores :)
ResponderEliminarAquele abraço
Um dia experimento :)
ResponderEliminarBeijinhos e boas corridas!
Correr é entrar em um estágio meditativo é quase correr de olhos fechados mesmo, é estar presente em vários lugares é viajar no tempo e ultrapassar as barreiras físicas da mente.
ResponderEliminarBoa dica.
Quem sabe um dia.
Beijos
Ju
Obrigado, João! Também eu! A sonhar e não só nos treinos!
ResponderEliminarAté durante a maratona, nos seus 42,195 km e nas nas várias horas que para nós dura, sonhos e projectos desfilam perante nós.
Talvez os atletas de alta competição a façam exclusivamente concentrados na prova, no percorrido e no que falta, no cumprimento ou não do tempo estabelecido, na posição relativa dos outros atletas que querem vencer. Mas isso só eles poderão dizer.
Um abraço, Amigo!
Carlos, Isa, Ju, obrigado pelos vossos comentários! Abraços e beijos
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